Baudrillard, I.A. como simulacros de Imortalidade



Jeferson Silva - PU3OSI


A dor da perda de um ente querido atua como força propulsora na busca pela prova definitiva de uma existência para além da vida física. A procura por uma solução científica que garanta algum tipo de imortalidade parece habitar o imaginário popular desde tempos imemoriais.

Na nossa história recente, o desenvolvimento tecnológico foi acolhido em diferentes épocas como uma possibilidade de transcender o físico e abraçar o metafísico. O que se destaca é a mudança de percepção ao longo do tempo, com a sociedade adaptando-se para manter viva a esperança de uma eternidade.

Basicamente transitamos de uma busca para comprovar a existência de um mundo metafísico com técnicas de Transcomunicação Instrumental para a capacidade pós-moderna de criar esse mundo virtualmente. Algo que lembra um episódio da série black mirror.

Avançamos mais ou menos assim:

Décadas de 1920-1930: Thomas Edison propôs o "Espíritofone", um dispositivo para comunicação com os mortos, mas o projeto não foi bem-sucedido.

Décadas de 1950-1960: O psíquico Friedrich Jürgenson popularizou a "Gravação de Voz Eletrônica (EVP)", alegando capturar vozes de espíritos em fitas magnéticas.

Década de 1970: Konstantin Raudive avançou na pesquisa EVP, publicando o livro "Breakthrough", documentando suas experiências e teorias sobre comunicação com o além.

Década de 1980: O pesquisador George Meek introduziu o "Spiricom", um dispositivo projetado para comunicação com espíritos através de frequências de rádio.

1981: Jean Baudrillard publica "Simulacros e Simulação", alertando para a tendência da sociedade tecnológica se apaixonar por uma vida baseada em simulacros, cópias que representam elementos que nunca existiram ou que não possuem mais equivalente na realidade.

Década de 1990: Surgiu a popularização da Internet, levando a tentativas online de comunicação com os mortos por meio de fóruns e serviços dedicados.

Década de 2000: Desenvolvimento de aplicativos e softwares, como o "Ghost Box" e aplicativos de gravação, destinados a facilitar a comunicação com entidades sobrenaturais.

2023: Com a evolução da Inteligência Artificial, surge a possibilidade de imortalidade ao programar a personalidade de uma pessoa em uma I.A., gerando assim uma forte sensação da presença de um ente querido já falecido.

Ao ler as notícias que encontrei aqui sobre o uso da I.A. para reviver os mortos, possibilitando uma imersão simulada da personalidade do ente falecido, não pude deixar de lembrar da perspectiva proposta no livro.

A obra "Simulacros e Simulações" de Jean Baudrillard, publicada em 1981, é uma análise sobre a natureza da realidade, da representação e da simulação na sociedade contemporânea. A proposta central neste livro é a ideia de que, na era atual, a realidade foi substituída pelos "simulacros" - representações que não têm uma correspondência direta com a realidade, mas que criam uma realidade própria.

O autor argumenta que vivemos em um mundo onde as imagens, os signos e as simulações tornaram-se mais importantes e influentes do que a realidade concreta que supostamente representam. Ele discute os conceitos de "simulacro" e "simulação", apontando para a ideia de que a sociedade contemporânea está imersa em representações que não têm uma base real sólida. Em outras palavras, as imagens e as representações culturais não refletem uma realidade pré-existente, mas, ao contrário, moldam e constroem a própria realidade.

O que me fez lembrar deste livro foi justamente a parte que relata sobre a capacidade de construir a realidade. Agora já é possível estudar meios de recriar na forma de algoritmo inteligente a personalidade simulada de uma pessoa querida.

Neste livro Baudrillard explora diversas áreas, incluindo mídia, política, cultura popular e tecnologia, para ilustrar como os simulacros substituíram a realidade e como as pessoas muitas vezes aceitam essas representações como se fossem a própria realidade. Ele argumenta que a sociedade contemporânea está imersa em uma "hiperrealidade", onde as representações se tornam mais reais do que a realidade que elas supostamente representam.

Assim, a tese central de Baudrillard em "Simulacros e Simulações" é uma crítica à perda da distinção entre realidade e representação, apontando para a prevalência de simulacros na sociedade pós-moderna. Algo que parece estar ocorrendo com o avanço da I.A.

Não pude deixar de experimentar aquela sensação "Black Mirror" ao me deparar com essa ideia de reviver os mortos com I.A. Acredito que em algum momento será possível criar representações da personalidade de uma pessoas de forma realista. O futuro é desafiador e um pouco assustador também!

Será que Baudrillard estava certo?

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